Em mais de 15 anos de experiência docente, devo ter dado centenas, milhares de aulas. Mas, não tem jeito: a cada nova aula que tenho de dar, reviso todo o material, me faço perguntas que posso ter de responder na aula, busco atualizações em dados estatísticos… Enfim, me preparo, não apenas por dever de ofício, mas pela óbvia constatação de que minha performance, no momento da exposição do conhecimento, estará sempre em julgamento.
O coração dá uma leve disparada antes de entrar em sala? A boca dá uma secada? Claro! O nome disto é ansiedade, uma ferramenta adaptativa que nos permite filtrar dos estímulos sensoriais possíveis situações de risco, e nos preparar pra elas. Uma resposta evolutiva, fisiológica, de nosso organismo.
Da maneira como descrevo, fica claro que a ansiedade, por ela só, não é uma doença, algo fora do normal – embora, de uns tempos para cá, veja as pessoas cada vez mais preocupadas em definir se o que sentem é ou não uma doença.
Quando nossos ancestrais viviam na floresta e ouviam algum barulho, sabiam que era sinal de que deveriam se preparar para lutar ou fugir… Os que se descuidaram, não entenderam o estímulo que indicava possível situação de risco, ficaram por ali mesmo.
Linha tênue
A ansiedade cruza a barreira invisível entre normal e patológica quando se torna incapacitante, quando a expectativa por determinada situação alcança proporções que levam à sua evitação – o músico que não consegue se apresentar, o jogador que passa mal e não vai a campo, o profissional que inventa desculpas para não fazer aquela apresentação para a qual tanto se preparou.
A ansiedade patológica difere da normal com relação a sua intensidade e/ou duração, e por causar sofrimento significativo à pessoa ou até mesmo incapacitar o indivíduo a desempenhar a função para a qual deveria prepará-lo.
Na maior parte dos casos de ansiedade normal, podemos usar a meditação ou ferramentas recentemente introduzidas em nosso dia a dia, como o Mindfulness, podem ser extremamente úteis. Mindfulness, por exemplo, preconiza que se esteja presente 100% naquilo que estiver sentindo.
Quando reconhecemos, em nossos pensamentos, o que nos incomoda, mas não nos deixamos afetar, a técnica atingiu o efeito desejado. A psicoterapia também pode ajudar muito mesmo nos casos de ansiedade normal, ajudando a desenvolver a resiliência (resistência psíquica).
Em casos de ansiedade patológica, a avaliação psiquiátrica é fundamental para a identificação do tipo de transtorno específico e para determinar um prognóstico e conduta terapêutica para diminuir a ansiedade. A associação com a psicoterapia também é fundamental para o tratamento e para melhorar a qualidade de vida.
A força do exercício
A ansiedade não distingue quem atinge: jovens, crianças, adultos, gente de todas as orientações sexuais, credos. O medo da exposição, de ser ridicularizado em público, pode vir lá de trás, da mais tenra infância. Esta ansiedade social representa um Transtorno de Ansiedade, que merece atenção e cuidado. E esta atenção pode – e deve – vir sob a forma de um “tratamento” extremamente trivial: atividade física. Já está provado cientificamente que o exercício funciona como válvula de escape fisiológica e natural para a ansiedade.
Em mais uma analogia, podemos pensar na panela de pressão para abordar o acúmulo de estresse e ansiedade. Tomar um ansiolítico para dormir é como baixar o fogo. Não se impedirá a pressão de voltar, mas o som do apito da panela baixará, temporariamente. Se não tratarmos a causa-base, não tirarmos a panela de pressão do fogo, ela voltará a apitar!
O exercício físico seria algo como tirar a panela do fogo. A atividade é neuromoduladora, promove a neuroplasticidade e chega a mudar a morfologia do cérebro (do hipocampo). É melhor do que a medicação a curto, médio e longo prazos.
Minha recomendação, então, é que, antes de procurar soluções “rápidas” ou “fáceis”, o ideal é que tentemos mudar nosso estilo de vida, implementando a prática regular de exercícios, para que tenhamos melhores anoitecer e sono, menos ansiedade e mais qualidade de vida.
Marco Andre Mezzasalma
Médico psiquiatra, doutor em Psiquiatria pelo IPUB-UFRJ e especialista em transtornos de ansiedade
CRM: 66722-6
